sábado, 28 de março de 2009

Cuenca e os moinhos de vento


O novo e o antigo me encaram freqüentemente aqui na Espanha. A começar pela vista da minha varanda, onde uma igreja renascentista divide espaço com um mirador meio futurista (e meio brega, diga-se).
Mas isso me ocorreu na volta de uma viagem de ônibus que fiz a Cuenca, uma cidadezinha a duas horas de Madrid, na região de Castilla-La Mancha, no feriado que tivemos quinta passada.
Um moinho de vento que só fazia me lembrar a Dom Quixote (e ao resturante Cervantes de Copa hmmmm) deu lugar, alguns quilômetros depois, aos gigantescos moinhos geradores de energia eólica.
Não sei qual teve o maior impacto sobre mim: se o moinho antigo e solitário fincado em um pueblo (povoado) no meio de um descampado de Castilla-La Mancha, que me lembrava das lições de Dom Quixote, como a de viver seus sonhos, criar sua própria realidade, conquistar sua liberdade com o esforço do dia-a-dia, enxergar o melhor nas pessoas, etc. Ou se os moinhos brancos gigantes e enfileirados, onipotentes, nobres, que me apontavam o novo mundo, as novas possibilidades, as alternativas viáveis, etc.
Apesar de tão diferentes, os dois lados estão sempre ali, e não falo só dos moinhos: também do restaurante galego super tradicional que almocei hoje vizinho à cafeteria contemporânea do museu Reina Sofia, onde comi a sobremesa; do centro antigo de Madrid que fica em frente à parte nova da cidade, cheia de arranha-céus; das aulas de doutorado em Grécia Antiga que acontecem na sala ao lado da especialização em novas fontes de energia; do bairro tradicional de Chamberí perto do super moderno Chueca, e por aí vai.
É como se todos me dissessem que está tudo integrado, como as casas da cidade de Cuenca, construídas sobre, sob e entre as rochas características daquele povoado.
É como se me dissessem para nunca esquecer o passado maravilhoso e os passos do futuro, enquanto desfrutamos do caminho do presente.
Agradeci, fechei os olhos e acordei em Madrid. Um presente.
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Agora, as fotos de Cuenca!

Cuenca é uma cidadezinha pequena - tão pequena que chegamos lá as 14h e adiantamos nossa volta das 20h pras 18h porque já tínhamos visto tudo huaahuahuahau -no meio de rochas. Tem os prédios cheios de cores fortes, ao contrário da maioria das cidades monocromáticas da Espanha. Aqui, alguns desses prédios na Plaza Mayor:


Aliane e José e a igreja da Plaza Mayor:

Vista geral da cidade:


Uma casa tão integrada às rochas que se confunde com elas:


Eu em frente à casa "colgada", que parece estar pendurada nas rochas:

Ó eu aqui mãe!

domingo, 22 de março de 2009

É primavera

A primavera chegou oficialmente ontem aqui na Europa, mas, como já contei, há umas boas semanas que as temperaturas estão cada vez mais amenas e o sol, cada vez mais forte.
Como ficar lendo coisas sobre o clima é chato,segue uma sessão de fotos do picnic que fiz hoje com a Paz e os amigos dela neste domingo e, em seguida, do almoço na varanda de casa domingo passado:
Fizemos o picnic no jardim do Templo de Debod, um templo egípcio dado à Espanha na década de 70 por agradecimento à ajuda em uma busca arqueológica no Egito
O picnic é um programa muito comum por aqui quando o sol começa a sair. Minha tia que morou em Nova York disse que o mesmo passa por lá. As pessoas levam pros parques um monte de comida e bebida - que, no caso da Espanha, costuma ser tortillas e saladas feitas em casa, empanadas de atum (um pastel de forno) ou sanduíches de lula ou presunto ibérico comprados pela rua. Colocam uma toalha ou nem isso na grama e fazem uma bela farofada.
Um delicioso almoço de domingo na varanda...
...que se transformou em show de flamenco...
...e, logo, em festinha com música e vinho.

Amanhã conto e mostro fotos da viagem que fiz na quinta-feira.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Pulgas em Madrid

Não, não entrou pulga no meu quarto e menos ainda passei perto de algum vira-lata. O título se refere ao El Rastro, o mercado de pulgas de Madrid e tema da minha primeira matéria como free lance daqui de Madrid. O link para ela é esse:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/vitrine/vi0703200904.htm, mas reproduzo aqui o texto na íntegra e com fotos, que seguem abaixo intercaladas com a matéria.

MERCADO DE RUA ESPANHOL GANHA FORÇA COM CRISE
Criado no século 15, El Rastro baixa preços dos artigos, que vão de sino de bronze a blusas da Zara de segunda mão a 1 euro

LUISA BELCHIOR
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE MADRI
Se viajar em tempos de crise é um desafio aos bolsos, voltar para casa de sacolas cheias pode não ser tão penoso. Ao menos para quem estiver disposto a garimpar. Na Espanha, o país da zona do euro mais atingido pela crise, segundo a União Européia, o mercado de pulgas medieval El Rastro, um dos mais famosos e antigos do velho continente, também apertou o cinto e baixou ainda mais os preços de seus artigos _que vão de roupas de marca de segunda mão aos mais variados objetos de antiguidade.
A tarefa não é fácil, porque o mercado, criado no século 15 se traduz hoje em cerca de 1.200 comerciantes, segundo a associação de vendedores Rastro, que, todos os domingos e feriados, montam barracas nas ruas do bairro da La Latina, em uma zona onde funcionavam matadouros.
Soma-se a isso a as pouco mais de cem mil pessoas que, alheias às liquidações de inverno das lojas espanholas a poucas quadras dali, circulam pelo mercado a céu aberto a cada edição, de acordo com a prefeitura de Madrid.

A reportagem se juntou a essa multidão e descobriu como encher a sacola de boas compras, que não ultrapassaram os 35 euros e chegam a 1 euro, por artigo.
O roteiro tradicional pelo Rastro começa na saída da estação de metrô La Latina, onde o mercado medieval ainda é eminentemente turístico. Mesmo assim, já dá para fazer boas garimpadas por ali. Na rua Mandonadas, a primeira depois da saída do metrô, há chapéus charmosos, customizados ou com lacinhos, a 10 euros e casacos de couro a 25 euros.
No fim da rua, que desemboca na praça de Cascorro, um barraqueiro vende conjuntos charmosos de gorros com cachecol ou luvas, todos de linha, a 5 euros. Foi a melhor relação custo-benefício deste tipo de produto encontrada na feira pela reportagem.
O que se cobra por luvas e cachecóis por ali, contudo, não são muito diferentes dos de lojas ao redor da Puerta del Sol, o centrão turístico de Madri, além de a qualidade ser pior. Para esses itens, os melhores negócios estão em lojas de acessórios instaladas dentro das estações de metrô da cidade.
Mas os preços vão baixando conforme se desce a rua Ribera de Curtidores, a principal do Rastro e transversal à Mandonadas. Por lá, já se encontra uma jaqueta de couro a 15 euros, casacões de lã e algodão a 10 euros, meias estampadas a 4 euros (o par) e pashminas a 2 euros. Estas últimas, expostas em uma das barracas mais disputadas na feira, custavam 5 euros no último verão europeu, “até chegar a crise”, conta o vendedor Sarget Gasseh, 32.

Já os casacões, apesar da qualidade inferior aos de lojas de Madri _a maioria tem menos de 50% de lã na composição, contra uma média de 60% que as etiquetas de marca afirmam ter_, custam no Rastro menos da metade do preço praticado nas “rebajas”, as liquidações espanholas.
Na Zara, por exemplo, uma peça em lã com poliéster não sai por menos de 59 euros. E, embora as marcas espanholas ainda não tenham divulgado um balanço das vendas neste inverno, a queda nas vendas já é visível, segundo contou à reportagem a gerente da Mango Isabel Muñoz.
“Ninguém está comprando como antes. No ano passado, elas [clientes] gastavam como loucas. Agora, compram só o que realmente precisam”.
Já no Rastro, o ápice dos efeitos da crise se mostra em uma barraca de roupas de segunda mão. Por 1 euro, vende-se casacos e blusas usadas de marcas como Zara, Sfera e Mango, dispostas em uma pilha intensamente remexida pela multidão que costuma cercar o ponto.
“Muitas meninas de Madri só se vestem no El Rastro. É muita diferença, aqui a gente paga 1 euro em uma blusa, isso é incomparável”, conta a brasileira Amanda Marques, 22. Ela é a comerciante Rita Rodrigues, 46, que vivem nas redondezas de Madri, contaram que atravessam a cidade para comprar no mercado medieval.

Depois do banho de roupas, é no fim da Ribera de Curtidores que o mercado mostra seu lado mais tradicional, já desvelado aos poucos nas ruelas transversais. Ainda na Ribeira de Curtidores, há facas de 6 a 10 euros e castanholas a 5 euros o par.
Nas ruelas e praças no entorno da via, colecionadores e vendedores de antiguidades estão mais dispostos a pechinchas. Na rua de Carlos Arniches, por exemplo, há achados como maletas de couro entre 20 e 35 euros (dependendo do tamanho) e um sino em bronze com ilustrações do clássico espanhol “Dom Quixote” (Miguel de Cervantes) por 12 euros.
Por ali, é possível também recarregar as energias com poucos euros e preços congelados mesmo com a crise. O disputado El Capricho Extremeño oferece sanduíches de toda a sorte de sabores – como salmão defumado, presunto ibérico e camarões – por preços que vão de 2 euros a 3,50 euros, os mesmos praticados no último verão europeu.

Como quase tudo no Rastro, porém, é preciso não se importar com filas e multidões para comer ali. Também é importante ficar de olho nas bolsas, porque nessa parte da feira os “batedores de carteira” são mais frequentes, segundo a prefeitura de Madrid.
“Os meus fornecedores aumentaram os preços, mas eu não repassei isso aos clientes. Prefiro ganhar menos e não perdê-los. Temos que nos adequar à crise”, diz Manuela Gonzalez, proprietária do restaurante.
Pelo visto, o Rastro está tirando bom proveito dela. E os consumidores também.
Serviço
- Como chegar:
De metrô: paradas La Latina e Puerta de Toledo (ambas da linha 5), Tirso de Molina (linha 1) ou Embajadores (linha 3).
De ônibus: linhas 16, 33, 35, 41, 60, 148 e Circular.
- Horário: domingos e feriados de 9h as 15h.

domingo, 8 de março de 2009

Domingo de sol


Depois de um break com uma semana de frio e até um pouco de neve, o sol e o tempo bom voltaram a Madrid neste fim de semana. Hoje, domingo, as ruas estavam mais floridas, com um batalhão de mesinhas cuspidas pra fora pelos restaurantes e lotadas de gente por todos os lados - uma das minhas compañeras de piso disse que nem sequer conseguiu entrar no El Rastro, o mercado de pulgas de Madrid que será tema do próximo post.
Eu passeei pelo Parque do Retiro, o principal da cidade e que, como o Ibirapuera paulistano, é a praia de Madrid, com gente de todo o tipo mas, sobretudo, muita família. Depois de caminhar por todo o parque, almoçamos nos jardins do Museu do Prado, que seria, digamos, a praia do Leblon madrileña, uma versão mais "cool" de quem se estira na grama pra pegar sol.
Para que se entenda melhor, segue uma sessão de fotos. E, como se diz por aqui, "ojalá" o tempo continue assim e antecipe a primavera, que só chega em algumas semanas!
Bronze no Parque do Retiro


Multidão no Retiro

Eu e Aliane, amiga brasileira, e o já florido jardim do Retiro

Aliane e Jose, peruano, no almoço nos jardins do Prado. Ao fundo, a fila para entrar "di grátis" no museu do Prado, que não cobra a visita aos domingos a partir das 17h

A turma do bronze no Prado

E o pessoal dos restaurantes aproveita o sol pra espalhar as mesinhas na rua. Este aí é ao lado do meu prédio, que aparece ao fundo

quinta-feira, 5 de março de 2009

Metro, bus, carrinho de parque de diversões e esse "absoluto dom de existir"

Na noite passada eu sonhei que esperava o metrô quando, no lugar do carro normal, chegou um carrinho de um parque de diversão pelos trilhos. Eu senti um êxtase e, mesmo sem saber para onde ele me levaria, quis entrar nele de qualquer maneira.
Acordei não pensando nisso, mas em chegar no horário que marcaram para eu fazer a "tarjeta de residencia", a tal que me permite trabalhar. Tinha que estar na polícia extrangeira as 9h, o que é madrugada considerando o horário que tenho acordado aqui e que, no noite anterior, fizemos uma festinha no master pra comemorar o fim do primeiro trabalho.
Depois de sair da polícia, uma amiga venezuelana que também tinha o mesmo horário disse que ia pegar um ônibus em vez do metrô e me deu a idéia de fazer o mesmo, pra variar um pouco a vista, já que no metrô a paisagem é escada rolante e parede. Procurei pelos pontos de ônibus algum que parasse perto da minha casa e encontrei.
Entrei no "bus" e logo percebi que as amplas janelas me ofereciam um tour pela cidade, como um carrinho de parque de diversões. Na hora, lembrei do meu sonho...e lembrei de momentos como as vezes que andei nos carrinhos da Disney, e me alegrei ao pensar que nada no mundo me tira essa sensação de êxtase, sensação que eu tive na Disney, no sonho e naquele momento, quando uma voz no ônibus anunciava que "são 10h do dia 5 de março de 2009", quando eu curtia aquele tempo presente, aquela paisagem, aquela água que bebia e esse "absoluto dom de existir".

terça-feira, 3 de março de 2009

A Espanha pós-carnaval

Agora que no Brasil o carnaval terminou e ano se iniciou de verdade, aqui na Espanha o 2009 também começa ganhar rosto. Deve porque entramos em março no ano do Sol, segundo uma amiga me disse.
As feições já traçadas do 2009 espanhol são mais ou menos assim: um novo cenário político com duas eleições confusas deste fim-de-semana - no País Vasco, que deixa de ser nacionalista pela primeira vez desde ditadura, e na Galícia, com vitória da oposição do governo, o PP - uma economia bem afundada, com a maior taxa de desemprego da Europa (15%), um presidente cada vez mais impopular e denúncias de corrupção na política - um ministro foi demitido por caçar sem autorização com o principal juiz espanhol no dia em que este ordenou a prisão de dezenas de membros da oposição do governo por supostamente beneficiar empresas em licitações.
(Sim, a Espanha é a América Latina da Europa)
Parece que até o tempo entrou no clima e o sol que estava firme e forte desde meados de fevereiro deu um sumiço.
Mesmo assim, tenho sentido que os espanhóis estão começando a buscar uma luz no fim do túnel. Os jornais se mostraram esperançosos com os resultados das eleições e as pessoas parecem saber que daqui a pouco o sol sairá de novo.
Da minha parte, essa foi uma semana produtiva. Finalizei o primeiro dos cinco trabalhos do master, que a turma comemorou com uma festinha ontem, e nesta manhã tive a reunião para fazer a "tarjeta de residência", que me permite trabalhar. Nesses dias, as aulas são sobre África, com um professor da República Democrática do Congo, que dá um panomarama muito diferente sobre tudo que eu já havia aprendido sobre o continente. Aliás, tenho que correr para a de hoje. Afinal, o ano já começou.