terça-feira, 16 de junho de 2009

Do bar árabe ao brasileiro em 24 horas. Brigada, meu anjinho

Sabe essas histórias loucas do tipo uma reviravolta em 24 horas, uma pessoa que vira seu melhor amigo em duas horas e ficar até as 6h na rua vagando pela noite? Nunca acontece comigo. A minha prudência e os meus pés fincados no chão não permitem.
Não permitiam, ou melhor, não permitiram entre a noite de sexta e de sábado passados, período em que fui da biblioteca pro bar para trabalhar, fiz uma amizade no meio do caminho, briguei com o dono do bar, saí de lá pra (espero) nunca mais voltar, varei a madrugada madrilenha conversando com o novo amigo, fui a uma procissão na manhã de sábado, fiz uma sessão de fotos (como fotógrafa, claro), fui a uma entrevista e consegui um novo emprego.
Ok, agora explico com a minha tradicional calma e lentidão.
Como já contei antes, estava trabalhando em um bar árabe nos fins de semana. Não era bem a idéia romântica que eu tinha de trabalhar num café europeu, aonde as pessoas pediam um muffin com chocolate quente enquanto liam seus livros de sociologia com a mão o queixo e as pernas cruzadas sobre delicados banquinhos e ao som de uma música leve de fundo. Mas era uma grana, e só por isso já valia.
Valia, eu disse bem. Não foi pelo trabalho cansativo e braçal, pela concentração constante pra não derrubar nenhum copo, pela música horrível que penetrava nos mes sonhos mais profundos, por esfregar o chão e caminhar 15 minutos até o ponto de ônibus depois do expediente. Nada disso me faria sair correndo dali.
Mas os árabes começaram a encher o saco. Além de muito grossos e estúpidos, os dois ficavam no bar o tempo todo e me faziam exigências, cada qual a sua maneira, o tempo todo, do tipo obrigar um casal a se mudar de mesa, dar bronca num grupo de meninos que demorava a se decidir pela bebida e proibir a venda de chás orientais depois da meia-noite, mesmo que a pessoa tivesse ido até o bar unicamente para prová-los.
Embora a minha alma carioca quisesse mandá-los pra puta que os pariu o tempo todo, pratiquei minha paciência e fui levando. Até que um dia...
O dia era sexa-feira 12 de junho, e eu andava em direção ao bar procurando desesperadamente uns chineses que ficam na Puerta del Sol oferecendo massagens em um banquinho, pra aliviar a tensão nas costas. Não achei, então fui caminhando tranquilamente até que, do nada, decidi entrar num café, que tocava Jorge Drexler, um cantor uruguaio que eu adoro. Que coincidência, pensei, pouco antes de o garçom do lugar me perguntar, do nada, se eu era brasileira. Que coincidencia, repeti, agora em voz alta, quando ele me falou que teve a sensação que o próximo cliente a entrar seria brasileiro, pra traduzir um poema em português do Chico Buarque que ele tinha nas mãos.
Depois de traduzir uma parte, disse que se desse tempo voltava lá porque trabalhava ali em frente, apontado qual era o bar. Fiquei pensando naquela coincidencia durante a jornada de trabalho, mais uma vez estressante, até que, quase no final, o tal do garçom me aparece lá, dizendo que me esperaria sair.
Um dos árabes, que já tinha demonstrado umas pontas de ciúmes sempre que eu conversava com qualquer pessoa do sexo masculino - o que estava me deixando seriamente preocuapada - olhou com cara feia e aí pronto, foi o que faltava. Ele ficou puto ao perguntar se o garoto era meu amigo e descobrir que eu o tinha conhecido naquela noite, começou uma discussão, os argentinos que trabalham, e que já tinham me alertado sobre a incompatibilidade do nosso sangue latino com o deles, lá levantaram, enfim, armou-se um circo.
Aí sabe aquelas cenas de filme que congelam e um personagem fica de fora analisando? Foi exatamente assim que me senti. Pensei: não, peraí gente, O QUE QUE É ISSO? que lugar é esse??? socorro.
Resumindo, já que isso tá virando capítulo de livro, saí de lá naquela sexta pra nunca mais voltar, e quando coloquei o pé pra fora lá estava o tal do garçom me esperando. Se desculpou e disse: acho que te arrumei um problema. Eu olhei e disse: não, acho que você me tirou de um problema.
Depois de ficarmos até as 6h conversando (sim, conversando) na Puerta del Sol sobre as coisas mais loucas como se fossemos amigos desde o Jardim II - o que foi aos poucos me despindo da energia pesada do bar árabe - nos despedimos e eu voltei pra casa, tomei um banho, deitei na cama e pensei: obrigado, meu anjo da guarda, por enviar alguém pra me tirar dos caminhos errados e me colocar nos bons.
Acordei tarde no dia seguinte, 13 de junho, mas a tempo de ir na Igreja de Santo Antonio em homenagem ao dia dele (não, não fui pedir marido). Depois de também agradecer e tirar fotos da comemoração, fui num restaurante brasileiro perto da minha casa onde havia deixado um currículo há tempos e que agora, justo agora, precisavam de um extra.
Saí de lá com um novo trabalho - agora entre brasileiros, pães de queijo, feijoada, aipim, cajuzinho, DVD do Paulinho da Viola - mas, principalmente, muito feliz com a sensação, a mais forte que já senti, da proteção e das mãos que constantemente se estendem a mim.

Bom, pra amenizar, umas fotos da procissão de Santo Antônio:

Mocinhas fantasiadas na procissão


"Meninas" na fila da tradição do alfinete (elas colocam a mão no bolo de alfinete e o número de alfinetes que grudarem na mão, diz-se, é o número de maridos que a moça terá)


Casal na igreja de Santo Antônio

terça-feira, 9 de junho de 2009

Eu, Luisa B., 26, jornalista, garçonete, estudante, dona de casa, assessora de imprensa de ONG, imigrante e candidata a doutoranda

Tá, todo mundo é um pouco de tudo na vida, mas acho que eu nunca tinha sido tanta coisa ao mesmo tempo. Me dei conta disso a caminho da aula numa tarde em que tava me sentindo meio tonta. No mesmo dia, contabilizava uma entrevista de (sub)emprego, outra para um estágio, uma pesquisa na biblioteca para um trabalho do master, uma entrevista (agora como entrevistadora) para uma reportagem e a entrega de uma documentação pra um programa de doutorado.
Por coincidência, ou não, topei nesse mesmo dia com um artigo do New York Times dizendo justamente como fazíamos tanta coisa que não prestávamos atenção verdadeiramente em nada. Pareceu um recado pra mim.
Agora explico um pouco o título: Depois de semanas distribuindo currículos pela cidade, comecei a trabalhar nos fins de semana num bar árabe(sim, eu já quebrei um copo), no maior estilo "mil e uma noites", com mesinhas e banquinhos baixos, luz fraca, música ambiente e muita narguila, aquele fumo árabe. A galera fica lá no maior relax, enquanto eu corro pra lá e pra cá até as 3h30, quando paro pra fazer a faxina final. Depois de uns 15 minutos de caminhada até o ponto de ônibus noturno e de um bom banho pra tirar o cheiro da narguila, eu caio dura na cama lá pras 6h!
Ao mesmo tempo, estamos na reta final das aulas do master, com entrega de trabalhos semanais. A partir de julho, entro na fase "prática", uma espécie de estágio que eu vou cumprir numa ONG de meio ambiente até o fim de julho, quando então finalizo o processo de inscrição pra um doutorado.
Isso tudo pra não falar de uma atividade que tem tomado muito o meu tempo: procurar passagens baratas nas companhias "low cost". Gente, é um vício, cada vez que você entra no site as passagens tão mais baratas. Hoje mesmo eu encontrei três por 1 euro. Sim, disse 1 euro.
Mas mesmo toda essa agenda de "compromissos" não faz frente a essa rotina louca de trabalho que temos no Brasil. Ainda consigo fazer almoço e comê-lo tranquilamente (lembre-se que estou no país da siesta), dar uma corrida de manhã e enrolar bastaaaante na cama. E quando estamos fora do prazo de entrega de trabalhos, ainda dá pra passear por aí e aproveitar as dezenas de opções culturais que rolam pelas ruas de Madrid. Seguem fotos das que eu fui esse domingo:


Estréia de um filme de Bollywood (a Hollywood da India) numa praça de Lavapiés, o bairro tradicional de imigrantes. Reparem na construção ao fundo.


Eu e Bia no Starbucks depois de uma "maratona" pela Photo España, uma mega exposição de fotos em vários museus e centros culturais da cidade.


Dança indiana na rua.