sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Portas

Não sejamos aquele que espera que se lhe abra uma porta na parede que não tem porta.
Esta é a frase que me vem à cabeça na noite desta sexta-feira 13 (!), depois de assistir na tv espanhola ao belíssimo filme "O Jardineiro Fiel" e, em seguida, escutar outra vez a notícia de que 42% dos jovens espanhois estão desempregados, tudo isso enquanto tentava seguir com o meu trabalho de fim de curso.
E foi tentando estudar que me deparei, enquanto abria mais uma tese para começar a ler, com o poema Tabacaria, de Álvaro de Campos/Fernando Pessoa (aquele do "não sou nada, nunca serei nada, não posso querer ser nada. À parte disso, tenho em mim todos os sonhos do mundo"). "O mundo é para quem nasce para o conquistar" diz a primeira frase do poema citado pelo autor da tese.
Pronto, estava aí a desculpa perfeita para parar de estudar e dar uma passada aqui no blog.
É que, embora pareçam sem nexo, estas três informações - o filme, os jovens desempregados e o poema - me disseram a mesma coisa. Me disseram da importância de deixar pegadas no mundo, como fazem os protagonistas de "O Jardineiro Fiel" (se não viu o filme vá vê-lo!), o autor que concluiu sua tese que agora leio e o próprio Fernando Pessoa, que, mesmo escrevendo da sua sina em "não ser nada", nesta sexta-feira 13 de 2010 me tocou com palavras escritas em 15 de janeiro de 1928, dia do aniversário da minha vó, que penso estar aqui comigo agora.
Mas as três informações me disseram também da angústia em não conseguir deixar essas pegadas, angústia que deve sentir boa parte desses milhões de jovens desempregados, que a Organização Internacional do Trabalho chamou esta semana de "geração perdida", angústia que sinto eu cada vez que não consigo avançar com meu trabalho e que deve ter sentido o poeta ao escrever que "serei sempre aquele que só esperou que lhe abrissem a porta ao pé da parede que não tem porta".
Embora estivesse sozinha no meu sofá numa noite de uma sexta-feira com festas típicas pelas ruas do caloroso verão madrilenho refletindo sobre essa angústia, não pensei em entrar em depressão. Nem se eu quisesse: na mesma hora recebi uma ligação do Skype do meu primo no Rio (como eu amo o Skype)!
O fato é que tudo isso me fez refletir sobre a importância de cada passo, de cada pegada que se deixa no mundo (sobre as quais já escrevi aqui). De não ser, ou pelo menos tentar não ser, aquele que espera que se lhe abra uma porta na parede que não tem porta.
Até porque paredes estão aí para serem derrubadas.

(p.s.: No próximo post deixo minhas reflexões abstratas para contar novas aventuras da edição de 2010 das férias de verão. Enquanto isso, quem quiser pode ler as de 2009, parte 1, 2 e 3).

3 comentários:

MarinaG disse...

É um dos meus preferidos do Pessoa. É por aí, enquanto tivermos todos os sonhos do mundo poderemos ser o que quisermos. Te vejo hoje no calorento (nem tanto) carnaval madrilenho, né? Besito.

André Kano disse...

vc sabe que as suas palavras são as minhas... um beijo

kitty disse...

hija,
geração perdida foi a da guerra, não teve opção, a sua é uma geração farta de conhecimento (lo sinto, pero às vezes até congestiona o pensamento) e que não se contenta com pouco em qualidade e quer sempre mais e mais...
as suas pegadas, você já deixou na parede que começou a derrubar há algum tempo